Onde Encontrar Remédios, Alimentos e Respostas para Questões Essenciais?

A questão sobre a possibilidade de venda de medicamentos isentos de prescrição (MIP) em supermercados retorna à pauta em ciclos regulares, suscitando debates a respeito da ampliação dos pontos de venda e do acesso a medicamentos. Os supermercadistas prometem oferecer preços mais competitivos do que os encontrados nas farmácias, o que, à primeira vista, parece uma solução viável para a população. No brasil, há mais de 90 mil farmácias ativas, uma média de uma farmácia para cada 2.300 habitantes. Esse número é excessivo, considerando que o ideal seria uma farmácia para cada 5.000 pessoas. Em áreas periféricas e em pequenas cidades, a quantidade de farmácias diminui consideravelmente. O que guia a abertura de estabelecimentos comerciais é, antes de tudo, a dinâmica do comércio. Portanto, a regulação da comercialização de medicamentos se faz necessária.
Embora se argumente que os supermercados poderiam diversificar os pontos de venda, é improvável que mantenham preços realmente mais baixos. Além disso, esses estabelecimentos não possuem a infraestrutura e o treinamento necessários para a comercialização de medicamentos, mesmo que se trate de MIPs. A questão que se coloca é: poderiam adaptar-se a essa função? A resposta é afirmativa; poderiam, inclusive, contar com farmacêuticos disponíveis. No entanto, isso levanta outra reflexão.
É imprescindível reconhecer que a venda de medicamentos está intrinsecamente ligada à prática comercial, e não à assistência farmacêutica, que desempenha um papel crucial na promoção da saúde. Medicamentos devem sempre ser validados dentro de um conjunto de práticas e procedimentos conhecidos como assistência farmacêutica. Portanto, a atividade comercial deve estar sempre subserviente à esfera da assistência farmacêutica, o que demanda a atuação efetiva do estado para regulamentar a situação. Em supermercados, a disposição para a venda de medicamentos deve ser restrita, assim como se deve limitar a comercialização de alimentos (exceto produtos especializados) e itens de limpeza nas farmácias, que não devem ser meros pontos de venda.
Enquanto os supermercados desejam expandir suas operações comerciais, as farmácias visam se transformar em estabelecimentos semelhantes às drugstores americanas. Contudo, o que funciona em um contexto estrangeiro pode não ser apropriado no brasil. O modelo de farmácias locais enfrenta diversos desafios que também precisam ser abordados de maneira adequada:
1. **Produção de Medicamentos**: Farmácias não têm autorização para produzir medicamentos. Contudo, algumas farmácias de manipulação frequentemente tentam contornar a legislação, produzindo medicamentos sem a receita médica necessária. Além disso, discutem-se práticas ilegítimas que envolvem a produção de medicamentos com marcas próprias. Muitos grandes grupos já oferecem produtos officinais e nutracêuticos, uma categoria que carece de regulamentação clara. Essa prática realmente melhorou o acesso aos medicamentos? A resposta é não.
2. **Venda de Assistência Médica**: As grandes redes de farmácias, com o desejo de se tornarem drugstores, almejam oferecer serviços de assistência médica, onde a receita do médico é atendida ali mesmo, com produtos de suas próprias marcas. Mais uma vez, isso trata-se de comércio, não de assistência farmacêutica, e nem de assistência médica propriamente dita.
A experiência dos países que adotaram esse modelo, como o México, mostrou-se desastrosa, uma vez que o sistema de saúde daquele país é fragmentado e carece de uma estrutura sólida, diferente do SUS brasileiro. No momento atual, existe a tentativa de as farmácias encurtarem as filas de atendimento nos prontos-socorros, apresentando-se como solução para os problemas crônicos do SUS e da assistência médica suplementar, sem, no entanto, considerar a assistência farmacêutica de maneira adequada.
A discussão sobre assistência farmacêutica no brasil permanece negligenciada, refletindo um cenário complexificado por questões de financiamento e judicialização do acesso a medicamentos. A recente súmula 61 do STF parecia promissora, mas seu avanço é questionado. Medicamentos precisam ter registro na ANVISA e serem submetidos à avaliação de tecnologia de saúde (ATS) para garantir o acesso à população, especialmente em um sistema de saúde que almeja ser universal.
Sem uma política sólida de assistência farmacêutica, acabamos presenciando transformações que fazem da saúde um mero comércio. É verdade que medicamentos e serviços médicos são bens comercializáveis, mas é essencial que a vigilância sanitária e a regulação do estado garantam um acesso responsável e ético.
A questão da venda de medicamentos em supermercados revela lacunas no modelo do SUS, trazendo à tona várias discussões mal resolvidas sobre a atuação das farmácias, a competitividade com supermercados, e práticas como a terceirização na fabricação de medicamentos. Farmácias têm potencial para expandir suas funções, oferecendo mais do que medicamentos. Elas podem realizar aferições de pressão arterial e exibir resultados clínicos por meio de tecnologias de ponto de atenção (point of care), além de aplicar vacinas mediante receita médica. No entanto, a assistência médica continua sendo uma prerrogativa exclusiva de profissionais da saúde.
É necessário expandir a rede de farmácias com iniciativas como o programa farmácia Popular do brasil e ampliar a lista de medicamentos disponíveis, embora isso exija uma reestruturação no financiamento, que ainda parece distante. Por fim, a responsabilidade de transformar a função comercial das farmácias em um serviço público de assistência farmacêutica recai sobre a política pública que regulamente essas práticas. Essa mudança é viável e urgente, e espera-se que o Ministério da saúde e a ANVISA tomem as devidas providências. A saúde pública de qualidade depende de ações que respeitem e integrem o papel vital da assistência farmacêutica.