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Idosos Iniciam Nova Jornada Acadêmica na Universidade

A mitologia grega nos apresenta Geras, o espírito que simboliza a velhice, como um companheiro de Tânato, a personificação da morte. Apesar de termos passado da era da Grécia antiga há milênios, a velhice ainda é frequentemente percebida como sinônimo de invalidez. Essa concepção, já ultrapassada, merece um debate ativo e urgente. De acordo com dados do IBGE de 2022, a expectativa de vida no Brasil é de 75,5 anos. No entanto, é intrigante notar que muitas pessoas sentem a necessidade de definir suas trajetórias de vida antes mesmo de atingir a metade desse tempo.

O consultor em diversidade etária, Mauro Wainstock, enfatiza que a vida não se restringe a um início tradicional em torno dos 20 ou 40 anos, mas pode realmente começar a partir dos 60, 70 ou até 80 anos. Wainstock argumenta que a reinvenção pessoal e profissional é uma possibilidade real: “Um aluno de 60 anos matriculado pode dar início a uma nova carreira até os 70 anos”, afirma. Essa perspectiva reflete a Revolução da Longevidade, uma nova visão que vem se consolidando ao longo dos anos.

O médico Alexandre Kalache, especialista em envelhecimento e presidente do Centro Internacional de Longevidade Brasil, identifica quatro pilares cruciais para um envelhecimento ativo: saúde, conhecimento, participação e segurança. “A saúde é fundamental, mas o conhecimento é igualmente vital”, ressalta Kalache, destacando que a revolução da longevidade deve ser acompanhada por uma transformação na educação.

O retorno aos estudos traz benefícios significativos, tanto cognitivos quanto emocionais. Edmar Bittencourt Pereira, 67 anos, é um exemplo inspirador. Após uma longa trajetória profissional, ele decidiu se matricular no curso de física da Universidade de Brasília (UnB). Para Edmar, os benefícios de retomar os estudos incluem uma notável melhora em sua autoestima e uma estimulação cerebral que o proporciona satisfação. “Fazer cálculos e estudar física tem sido extremamente gratificante para mim”, compartilha.

O psicólogo Fabrício Oliveira, especialista em gerontologia, corroborado por estudos e pesquisas, esclarece que voltar a estudar pode atuar como um fator de prevenção contra demências, estimulando a cognição e reduzindo os riscos da doença de Alzheimer. Kalache complementa que quanto mais conhecimento acumulamos ao longo da vida, maiores são as reservas cognitivas que poderão ajudar a prevenir doenças neurodegenerativas. “Investir na educação é uma forma eficaz de prevenção. Estudos mostram que cerca de 40% dos casos da doença de Alzheimer podem ser evitados com práticas educacionais que envolvam o exercício da mente”, destaca.

Além dos aspectos de saúde, a educação proporciona ganhos sociais significativos. A interação social ajuda a combater o isolamento e a depressão entre os idosos, promovendo um sentimento de utilidade e produtividade. “Estar em uma universidade permite que eles saiam de casa, interajam e continuem a crescer”, afirma Wainstock. Essa troca de experiências entre diferentes gerações enriquece não apenas os idosos, mas toda a comunidade acadêmica.

Muitos jovens e adultos ainda não percebem a riqueza que a convivência intergeracional pode oferecer. O próprio Dr. Kalache, aos 78 anos, menciona que constantemente aprende com os mais jovens. “Aprendo muito com essa nova geração, não apenas sobre tecnologia, mas sobre novas formas de viver e entender o mundo”, explica.

Infelizmente, o analfabetismo é uma barreira significativa para muitos idosos. Dados do IBGE de 2023 revelam que mais de cinco milhões de brasileiros acima de 60 anos não sabem ler nem escrever, o que representa cerca de 31,4% nessa faixa etária. No entanto, entre 2012 e 2021, o número de estudantes idosos nas universidades cresceu 56%, mostrando que muitos estão determinados a não se conformar com a ideia de apenas “envelhecer”. O crescimento do número de matrículas reflete uma mudança nas expectativas e nas possibilidades que os idosos buscam em suas vidas.

Para que essa inclusão na educação superior se amplie, iniciativas como a Universidade de Brasília (UnB) têm se mostrado fundamentais. Em 2024, a UnB lançou o processo seletivo 60 Mais, uma oportunidade para que pessoas acima de 60 anos ingressem na universidade de forma simplificada, focando em redações com temas contemporâneos, ao invés de provas tradicionais. Essa mudança visou facilitar a inclusão de quem ficou muito tempo fora do ambiente escolar.

Os idosos que buscam ingressar no ensino superior não estão apenas em busca de um diploma, mas de um espaço para continuar aprendendo e contribuindo. Melissa, uma estudante de 68 anos, expressa seu entusiasmo em participar da universidade: “Este é um novo capítulo em minha vida, e estou animada para aprender e compartilhar experiências”.

A luta contra o preconceito etário, conhecido como idadismo, é outro passo crucial para garantir um ambiente de aprendizado inclusivo. Este preconceito é um desafio que afeta tanto a vida profissional quanto as oportunidades educacionais dos mais velhos. Uma transformação social é necessária para que possamos ultrapassar estigmas e reconhecer que, com o avanço da idade, vem também uma rica coleção de experiências e sabedoria que devem ser valorizadas e respeitadas.

Em suma, a visão contemporânea sobre envelhecimento está em plena evolução. Reconhecer o potencial das pessoas na terceira idade é essencial para construir uma sociedade mais inclusiva e solidária. O envelhecimento não é o fim de uma jornada, mas um novo começo, repleto de possibilidades e oportunidades para aprendizado e crescimento pessoal.

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