“Desafios das Startups no Brasil: A Realidade do Trabalho na Era da Inteligência Artificial”

Os espiritualistas costumam afirmar que o universo é constituído por dois elementos fundamentais: o espírito e a matéria. Em outras palavras, tudo que existe se enquadra em uma dessas duas categorias. Embora essa afirmação possa parecer uma simplificação excessiva – e possivelmente seja – é inegável que, na última década, assistimos a um fenômeno intrigante em nosso planeta. Nele, aqueles que não atuam como “influenciadores” frequentemente se tornam investidores ou fundadores de startups.
Nos últimos anos, a cobertura da mídia, especialmente nas redes sociais, passou a criar a impressão de que influenciadores e empreendedores de startups habitam um universo privilegiado, onde o sucesso é garantido, inexistem riscos e a inspiração parece ter mais valor do que o trabalho duro. No entanto, essa visão irrealista sofreu uma reviravolta no final de 2023, quando a chamada “bolha” dos influenciadores estourou. Casos de envolvimento em esquemas de pirâmides financeiras, publicidades obscuras para sites de apostas e jogos de azar ilegais, além de uma queda acentuada na audiência, culminaram em um fenômeno que já foi observado anteriormente nos Estados Unidos: a “fadiga de influenciador”. Essa série de eventos levou a uma conclusão clara e inegável: os influenciadores estão, de fato, perdendo sua influência.
Por outro lado, a situação no universo das startups é bastante diferente. Vale destacar a importância da Lei Complementar 182, que estabelece o Marco Legal para o setor de startups no brasil, junto às leis de mercado que regulam as operações neste segmento. Diferentemente da dinâmica mais caótica do mundo dos influenciadores, as startups operam em um ambiente onde há normas e estruturas mais claras.
A glamourização das startups, um conceito amplamente disseminado, resulta da percepção errônea de que conquistar o investimento anjo é o único passo necessário para o sucesso. Para os investidores, há uma ideia ilusória de que, ao ingressar em uma rede de investimentos, eles fazem parte de um “clube” exclusivo. No entanto, a realidade é que garantir um aporte financeiro para o seu negócio é um processo que pode ser longo e cansativo, o que, muitas vezes, prejudica as operações da própria empresa. O tempo médio para se obter um investimento pode ultrapassar três meses e, após isso, a pressão aumenta: os empreendedores precisam demonstrar resultados significativos para garantir uma nova rodada de investimentos, que pode ser ainda mais exigente.
Pesquisas realizadas pela Anjos do brasil indicam que, até agosto deste ano, existiam 8.155 investidores ativos no brasil que injetaram capital em startups. Esse número é irrisório em comparação aos 422 mil investidores presentes nos Estados Unidos. Além disso, a quantia total investida em startups em solo americano atingiu impressionantes 18 bilhões de dólares (mais de R$ 100 bilhões) em 2023, em contraste com os apenas R$ 900 milhões investidos no brasil até o mesmo período. É evidente que o mercado de startups nos EUA é mais maduro e vem se desenvolvendo há mais tempo, enquanto o brasil, que ganhou destaque nesse cenário nos últimos dez anos, apresenta um crescimento anual de 10% no número de investidores.
Esse panorama revela que ainda existe um potencial enorme para o crescimento de startups no brasil, mesmo que o perfil de investimento em risco seja menos prevalente em nossa cultura, uma vez que o venture capital é, por natureza, um investimento de alto risco.
A interação entre empreendedores e investidores deve seguir uma regra clara. Enquanto os empreendedores buscam “smart money” – capital que vem acompanhado de expertise e orientação – os investidores estão à procura de negócios que sejam escaláveis, rentáveis e disruptivos, liderados por fundadores engajados e bem preparados. É crucial que os empreendedores estabeleçam conexões com investidores que conheçam seu segmento. Para os investidores, o apoio ativo e a colaboração com as startups são fundamentais para o sucesso conjunto.
Ao longo da minha jornada no ecossistema de startups, desde meu primeiro investimento em 2016, adotei uma abordagem colaborativa e focada no entendimento e na criação de conexões. Participo frequentemente de reuniões entre startups, clientes e parceiros, identificando oportunidades para crescimento e desenvolvimento de habilidades nos fundadores, preparando-os para os desafios futuros.
O empreendedorismo não é glamouroso e o investimento anjo deve ser encarado com realismo. A fase de investimento é marcada por trabalho árduo e por uma mentalidade de colaboração. É irreal acreditar que se pode enriquecer rapidamente com investimentos anjo, pois a média de múltiplos nos exits é 3 vezes o valor investido. Entretanto, um apoio mais robusto de investidores e redes pode melhorar esses múltiplos, favorecendo o sucesso das startups.
O ecossistema de startup no brasil está evoluindo rapidamente, abrangendo novas redes de investimento, aceleradoras, hubs de inovação e parques tecnológicos. Essa transformação é positiva, desde que as startups sejam as principais beneficiadas por essas estruturas.
Por fim, é essencial destacar que, embora a inteligência artificial (IA) esteja emergindo como uma ferramenta significativa para aprimorar análises de negócios, ainda há um longo caminho a percorrer para entender completamente seu impacto no ecossistema de startups. As grandes empresas de tecnologia, como Facebook, Apple, Netflix, Google e Amazon, ainda não mensuraram totalmente essa influência, enquanto novas startups focadas em IA crescem significativamente em regiões como o Vale do Silício. Portanto, é hora de inverter a narrativa: que haja menos glamour e mais realidade, promovendo uma cultura de trabalho e dedicação. O futuro dos negócios exigirá não apenas inspiração, mas um esforço genuíno para alcançar resultados tangíveis. Somente aqueles que se dedicam e se adaptam realmente prosperarão neste novo cenário.